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Palavras


Palavras e palavras e palavras. Era nisso que aquele quase vulto se resumia. Ali, no escuro, parada, sozinha. As palavras eram a única companhia. Era como se se pudesse vê-las, como se fossem vivas, como se pudessem se aproximar como estranhos e como todas se apoderavam de seu corpo praticamente inerte.

As palavras a possuíam, a usavam para o seu propósito sem saber que não passavam de palavras. Para ela as palavras não eram apenas isso, elas a dominavam, faziam-na escrava, escrita, escrivã de seu desejo incessante, insano de tentar se mostrar.

Era uma pobre garota e pobres palavras se aproximavam dela, palavras de baixo valor. Palavras duras, palavras pobres. Pareciam mendigos a cerceá-la, no entanto ela quem implorava sua atenção. Ela apenas concentia que chegassem perto, tão perto a ponto de tocá-la. Sentia um toque gélido, a cada nova palavra que se aproximava.

As palavras a tocaram e ela se entregou. Estava sozinha, sem ninguém para ajudar, pra tirá-la dali, do domínio das letras, dos fonemas... Ela ficou um longo tempo desligada do mundo ao redor, imersa, como que possuída por algo invisível aos outros, que não entendiam o que estava acontecendo. As palavras vinham, seguravam sua mão e preenchiam o papel e ela ficava sem espaço, sem ar. Compulsivamente, inevitavelmente presa em uma teia sem escapatória.

Então ela virava a página, e por um instante parecia querer voltar ao mundo real, olhava ao redor, via pessoas, todas distantes, não tinha forças para sair dali. Então a página a chamava. Página e palavras não queriam estar separadas. A página pedia mais e mais palavras, não se cansava.

Que importava se o que escrivia há muito não fazia mais sentido? As palavras agora eram suas amigas, levavam a dor embora consigo, levavam seu sofrimento... Na verdade, não levavam nada. Arrancavam os sentimentos dela em forma de declarações e imortalizavam no papel o que ela queria matar em sua mente, em seu coração.

As palavras se conteram. Era hora de parar. [Além de seus dedos a única coisa que ela ainda sentia era uma ou outra lágrima correr por seu rosto (às vezes ia de encontro ao papel), mas ela não se importava, e apenas continuava a escrever]. as lágrimas cessaram, o coração voltou a bater, ela sentiu o sangue voltar às partes de seu corpo, sentiu dor nas costas devido a posição desconfortável, sentiu tudo, tudo o que estava encoberto pela compulsividade das palavras. Ela cansou daquela necessidade de palavras. E estas a deixavam pouco a pouco, a enxurrada virava uma garoa cada vez menos intensas, ela conseguia até mesmo refletir sobre as palavras que vinham a sua cabeça. As palavras ficaram menos desesperadas, eram apenas palavras agora.

As palavras pararam. Ela levantou-se tentando se refazer, como se nada tivesse acontecido, como se não tivesse cedido outra vez à força das palavras, a vontade delas. Ela levantou e seguiu por onde já deveria ter ido há tempos. Para onde não fora ainda porque as palavras não a deixaram ir até dizer tudo o que tinham para dizer.

Talvez um dia eu conte o que as palavras tanto disseram naquela noite, mas não hoje.

19:20
10 de setembro de 2009
M.D.

1 comentários:

Catia Lindemann 11 de setembro de 2009 às 19:32  

Já faz tempo que acompanho vc...suas dores e raros momentos de contentamento...
Aqui tbm sou espécie de sombra que vc não vê rsrs...
Quantas vezes fui solidária c/ suas lágrimas e vc nem sabia.Bjs

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